quarta-feira, 12 de março de 2014

Carnaval dois-mil-e-catarse ou de como se faz uma foto suruba


E agora, o Brasil.

Viver um Carnaval no Rio de Janeiro foi indubitavelmente das experiências mais exigentes a que o meu corpo já sobreviveu. Empurrados pela cerveja e entorpecidos pelo calor, os membros sucumbem constantemente num bizarro limbo de dor e de prazer, mas nunca, nunca desistem. Mais um bloco, mais uma música, mais uma latinha/piriguete divida com dois, três amigos, um sacolé para refrescar, e segue outro bloco, que "o tempo ruge e a Sapucaí é grande".

Compromisso é coisa que o Carnaval carioca desconhece. As videntes que jogam búzios prometem pelas paredes fora trazer a pessoa amada em três dias. A pessoa amada está a cada esquina, e se a perdermos hoje, amanhã será desapegadamente de outro folião que calhe a aproximar-se-lhe. Já beijou hoje, oiço-os perguntar a uns e a outros, ah, então me beijaPuxa, beijo gostoso o seu. E é de beijos que se alimenta a festa mais desinibida de todas, a carne vale e vale tudo pela carne. Não se pode esperar que um compromisso sobreviva umas fugazes vinte e quatro horas. Uma hora talvez, e com sorte o destino dita o resto.

Beijos e folias à parte - que o meu corpo ainda a reclama - no Brasil fui descobrir amores e poesias raros de encontrar, e tão prazerosos de preservar. Ninguém me avisou que para além de fisicamente desafiante, esta seria uma viagem emocionalmente vertiginosa. E eu que das férias só costumo trazer cansaço acumulado e preguiça de voltar ao trabalho, desta vez trouxe um coração inundado de amor surpresa, de amigos que abraçam e me deixam impotente de felicidade, que me fazem chorar a bandeiras despregadas no aeroporto, desmastreada e perdida de voltar a este frio e a este país que julgava quente e percebo agora ser afinal moderadamente ameno, amenamente caloroso. Sem esperar, dei de caras com um povo delícia, que abraça sem meias medidas, que ama sem preconceitos, que beija como quem come um iogurte. E senti mais do que nunca o “peso” da herança comum que partilhamos, da história que construímos juntos, da bênção que é chamar o Brasil de país irmão. Ilusão da língua comum ou efeito das amizades encontradas, o certo é que nunca me senti tão em casa como neste país quente onde os insectos me devoraram sem tréguas, onde o calor impedia a maquilhagem de se me segurar no rosto, onde a cerveja substituiu a água durante dias a fio, onde a temperatura é tão alta que o mar quase não chega para a ludibriar.

Porque nasci portuguesa. Mas se perguntassem, teria escolhido nascer brasileira.


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