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Não sei em que tenho pensado nem quem tenho sido. Olho para trás e constato que por vezes, para uma coisa nascer, outra tem que morrer. E lá atrás ficou um caminho que podia ter sido o meu, mas ironicamente, não chegou a sê-lo. Senão, uma passagem de um violento luto, para uma vida mais plena, mais fluída, mas minha que dos que tanto me magoaram. Porque nos pensamentos já só viajam boas intenções, desejo puro de amadurecer e me dar à plenitude das coisas sem nelas me emaranhar. E tu, terno e apaixonado, seguraste na minha mão e puxaste-me de um lado ao outro, das trevas à luz, de um cadáver moribundo a metamorfose ambulante, todos os dias eclosão explosiva. Amor, amor, amor, oh tanto amor, meu amor, tanto amor que nunca te cheguei a dar. Porque no fundo de mim adormeci, acossada à pura felicidade que era ter-te só para mim, respirar o teu ar, partilhar a tua cama, ser a tua, a tua única, a primeira, a última, todas elas e nenhuma delas. Querias? Querias que tivesse sido assim diferente, assim ligeiro, assim assim, como tão bem sabíamos ser? Aventurados tantas vezes sem reserva cidade adentro, fodemos todas as esquinas, marcámos todas as praças, demos as mãos em todos os miradouros. E agora o que tenho, o que me deixaste, meu amor? Sabes o quê? Uma cidade que arde insana dentro de mim, que me corrói e provoca e me derrota para logo a seguir me levantar. Uma cidade que me faz e desfaz a cada olhar, a cada vez que te vejo menos lá fora espelhado nela, e dentro de mim, perdido, intenso, aquele olhar que só tu sabes. Fui tua, meu amor, e de mim dispuseste e desfizeste em mil pedaços que agora se reúnem, olha só, quem diria!
E eu que te amei tanto, meu amor!