quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

photo @ João Tamura

Hoje viajei ao passado, passei-te os dedos pelas memórias e pelos tempos que deixámos habitados em parte incerta. Viajámos pouco, tu e eu. Fixos ao presente e às realidades construídas e perspectivadas, pouco nos abstraímos, de nós mesmos e um do outro, de tão submergidos que ficámos daquele amor que me revolvia os órgãos e me transtornava cada célula. A tua pele já não adormece nos mesmos quartos que a minha, o cheiro que exalavas deixou de sobreviver às tuas partidas, e o teu peito já não obedece às leis da gravidade que inevitavelmente o atraíam para o peito que era o meu. De fundo, há uma melodia constante que me enleva e me leva, me apura os sentidos e me confunde os destinos. A saudade é agora quente e silenciosa, um hálito quente que bafejo na janela húmida enquanto a ponta dos meus dedos traça na condensação a inicial do teu amor, perdão, a inicial do teu nome. Perniciosa mas luminosa é a dualidade que me faz amar-te umbocadinhomenos/umbocadinhomais todos os dias. Sabes que as palavras tendem a esgotar-se. São já mais as que guardo para dentro que as que deixo por aí à mão de semear e de darem fruto. Tudo não passa agora de um vulto que assombra raras distracções, momentos de fraqueza em que o corpo cede e acede ao que já não é. 

Tudo uma questão de tempo(s) apenas. 
Passado. 
Presente. 
Futuro. 

sábado, 3 de janeiro de 2015



O cheiro do calor impregna o ar, o destilar dos poros relembra-nos o quão de carne e osso somos. Saímos agora da banheira branca onde nos despimos do sol e do sal, brancos e amarelos beijam-nos a vista enquanto insinuo a pele ao teu toque fugidio. Desprezas subtil a minha toalha molhada no chão molhado, peço-te ajuda com a loção e o cheiro da tua pela húmida desperta-me para a luminosidade que irradia este verão quente nesta casa de campo onde somos o mundo que nos rodeia e o quanto dele que nos cabe dentro. Repito o teu nome até onde mo permite a insensatez, intercalo-o com o meu enquanto os imprimo aos dois no branco destas paredes, nestes soalhos e pedras que pisamos descalços e perdidos de amores. A memória faz desta casa a mais feliz de todas as casas, e a mais triste quando tenho que a deixar. Triangulas a existência até onde o nosso entendimento a alcança, e tudo o resto é opacidade. 

A simbiose perfeita entre nada e coisa nenhuma.