terça-feira, 4 de novembro de 2014



Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida.
Clarice Lispector


À minha volta, contavam-se quase duas mãos cheias de corações partidos. Todas mulheres, todas sabiam de cor e salteado o outro amargo lado do amor. O lado obscuro da perda, do desaparecimento, esse lugar estranho onde a saudade manda mais que tudo o resto. Amor esse que é indubitavelmente a força maior da condição humana, construtor e demolidor, sereno e implacável. Em ritmados rituais, purgavam as dores da alma balançando mantras de esperança e de amor que se quer cumprir. Audaciosas bailarinas, agitavam-se na urgência de se cumprirem no seu propósito, recetáculos intemporais de compaixão e de vida. A dança enleva os corpos, tudo se transcende na compassada síncope dos braços que balançam, das pernas desenhando orações. No turbilhão das estrelas que caem lá fora, na esperança dos desejos que encetavam os corpos. Almejamos mais, muito mais. O mundo é todo nosso e de mais ninguém. 

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