segunda-feira, 29 de junho de 2015


Há metafísica bastante em não pensar em nada. 


A frase persistia em andar-lhe nos pensamentos ia para dias, não sabia porquê. Talvez porque desejasse simplesmente não pensar em nada. Fosse porque dava trabalho, fosse porque às vezes doía, sempre uma remota memória das coisas más que marcam. No exercício inglório de tentar vetar a cadência aos pensamentos, distraía-se movendo os dedos pela pele despida, entre o espaço que ia do osso firme da sua anca à derme suave que anunciava um princípio de seio. Sentia-se desejada e desejável, ciente do poder de abstracção que os seus dedos imprimiam em contornando as formas irregulares do seu corpo. Assim despidos sobre a cama, os corpos apresentam complexidade menor que a metafísica do em nada pensar. Despojados de amores e de ambições, tolhidos de esperanças ou de futuros, caminhando juntos para coisa nenhuma. A beleza que há em nada querer, em nada crer. Nada se querendo, tudo é muito, e em nada crendo, o peso dos dogmas é tanto como o de uma pluma. De tábuas rasas de compõem os dias.



Procrastinando o banho que a espera, prolonga-lhe o cheiro da pele que ele teima em lhe roubar. Lembrou-se que o dia mais longo do ano era aquele mesmo domingo, o dia em que exactamente às 17h38 as tardes mornas da primavera cediam lugar às tardes proibitivas de verão. Pensou no solstício e em quanta poesia ingrata cabia numa cama vazia no dia mais longo do ano. A vida cheia de paralelismos, e ela sempre tentando encontrar ligações entre os pontos, como quem une constelações em observando céus estrelados nos Verões da vida. Recordava a noite em que tinham soltado uma luz esvoaçante em direcção ao breu da noite, e em quanto de intenções nela tinha depositado, as esperanças que havia semeado naquele lugar. Tudo fumo, tudo pó. Sobravam apenas os corpos sem roupa, sobrava apenas a cama sem lençóis.

2 comentários:

  1. "Pensou no solstício e em quanta poesia ingrata cabia numa cama vazia no dia mais longo do ano."

    Isto está tão bom!

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    1. Obrigada =) curiosamente também é a frase que mais gosto no texto.

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