quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Quando o medo te é uma palavra estranha


Gostas de acreditar que és forte, que medos tens poucos, que o que já passaste faz de ti resistente ao tudo que há de vir. Mas dás por ti sozinha sentada num corredor onde esperas a tua vez para seres testada, que nem um rato num laboratório. Uma amostra disto, um exame daquilo. Ao teu lado, alguém fala sobre massas de 17 centímetros, sobre cirurgias e exames cujos nomes nem arriscas pronunciar. A miúda sentada ao teu lado não terá mais de 15 anos e discute temas difíceis com a mulher de meia idade que a acompanha. Não se lhe notam preocupações ou medos, como se uma estranha invencibilidade tomasse conta dela. Sentes os pêlos do teu braço eriçarem-se e sabes que não é do frio cortante que faz lá fora, tão pouco da música boa que ouves nos teus fones. O arrepio que sentes chama-se medo, uma sensação irracional por não saberes o que te vão dizer depois de te testarem. É inevitável pores em perspectiva o que fazes com o teu tempo, como ages com os outros, o quanto de generosidade ou frieza que pões nos teus atos naqueles dias normais em que a incerteza não paira sobre a tua cabeça. A luz imensa do corredor encandeia-te além do razoável, e tudo o que querias era que a luz se apagasse e uma mão segurasse a tua e te dissesse que está tudo bem. Tudo o que querias era que alguém te repetisse que és perfeita e te secasse a lágrima que ameaça saltar do teu olho a qualquer momento. Relativizas tudo e pensas uma e outra vez se tens amado o suficiente, se te tens deixado cuidar, se a pressa dos teus dias não te deixou mais fria e mais só, ao ponto da tua autonomia começar a fazer todo e o único sentido. Anseias sair para a rua e engolir um cigarro que camufle a tua ansiedade e o teu medo das coisas que ainda não sabes. Percebes então que estavas enganada o tempo todo sobre a tua total tolerância aos medos, pois não tens a teu lado a mão que tanto querias a segurar a tua, nem o peito que apoia a tua cabeça trémula. Sentes-te pequena, indefesa e desamparada. Até que ao fim de uma melindrosa espera chamam por fim o teu nome. Despes-te numa sala cheia de máquinas frias e és mais uma vez assaltada pelos quantos medos que cabem em ti.

Respiras aliviada quando sabes que tudo está bem. Mas o medo, afinal e apesar de tudo, o medo.

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