quarta-feira, 25 de junho de 2014


I drink much more than I ought to drink
Because it brings me back you...


Hoje quando me cruzei comigo no espelho, por pouco não me reconhecia. Olhei com mais atenção e vi o que me pareceu claramente ser uma mulher de quase trinta anos, roupas claras, pele morena, cabelo desalinhado mas arranjado para trás como que clamando respeito. E em olhando mais dentro, vejo de relance todas as pessoas que afastei de mim sem pensar duas vezes. Um após o outro, despedi-me de todos eles sem dó nem piedade. Uns sofreram mais do que outros, outros sobreviveram mais indiferentes, mas a todos acabei por abandonar, presa à vincada certeza que nenhum deles era o tal. E escrevi-lhe tantas cartas, e chorei-lhe tantas lágrimas, e o vinho que bebi enquanto esperei e cogitei, e os cigarros que engoli sentada esperando tão desejada aparição. 

Oh, evidências. A evidência terrível de um destino que nunca se me afiguraria favorável, mas ainda assim tão tentador. A vontade incontrolável e selvagem de mergulhar num pernicioso mundo de onde não poderia senão sair o escombro do que um dia fui. E assim foi brusca, impensada e dolorosa a força com que embati o corpo contra o teu, e lentamente o vi destruir-se tal foi a violência do impacto. E ainda assim, tudo o que mais queria era apertar-te até me confundir contigo e nunca mais te perder nem ver noutro lado que não fosse dentro de mim. Para sempre.

Hoje brindo à tua sagacidade, pois rapidamente percebeste a incompatibilidade permanente que nos uniu para depois nos apartar. Brindo a tua coragem, pois logo pequena me encolho ante o peso com que me esmagas em cada relance que me deites, em cada ar que ouses partilhar comigo, em cada linha de mar que é minha e tua quando as areias voltam a ser nossas. 

2 comentários:

  1. Até o disse em voz alta "isto está tão bom!". De cortar a respiração...

    "E em olhando mais dentro, vejo de relance todas as pessoas que afastei de mim sem pensar duas vezes. Um após o outro, despedi-me de todos eles sem dó nem piedade. Uns sofreram mais do que outros, outros sobreviveram mais indiferentes, mas a todos acabei por abandonar, presa à vincada certeza que nenhum deles era o tal." Isto então, não tenho palavras, tocou-me...

    ResponderEliminar
  2. Obrigada Raquel, acredita que o teu blog é dos que mais gosto de ler, e é daqueles onde mais me revejo. Às vezes tanto, que até fica estranho :) Beijo x

    ResponderEliminar