terça-feira, 12 de novembro de 2013

Photo @  Ana Ribeiro Lages 2013 Lisboa (vinte&oito)


Perdi o fio à meada. Deixei de contar as dezenas, centenas, milhares de cartas de amor sem carteiro que mas leve que se foram acumulando na minha cabeça a cada segundo que a distância aumenta e só me aperta mais o coração. A última, revia-a mentalmente uma segunda-feira, ainda não eram oito da manhã e já o vinte&oito fazia as honras descendo a Almirante pomposo para em passando a Palma, romper Martim Moniz adentro. Distraída, revia as palavras que se desarrumavam dentro, para logo depois seguirem aleatórias solitárias viagens rumo a nenhures.

Uma silhueta de sexo indefinido assoma-se ao lugar vago que ainda sobra no meu banco. Não olho, não me interessa, não quero saber de mais nada há muito tempo, não me preocupo, não questiono, não refuto. Aceito, espero e rejubilo ante a possibilidade da tormenta virar calmaria. Acenando-me gestos pouco precisos, julgo que a intenção dessa figura é tão só e apenas a de sentar. Desengano-me logo de seguida quando me toca ao de leve no ombro O seu título de transporte, por favor. Quando lhe devolvo o toque com o virar do rosto, não vou a tempo de elevar rápida a mão e secar a última lágrima, herdeira solitária da carta de amor que apenas cruzava os pensamentos daquela manhã. Ele segura-se nela (na lágrima) por alguns segundos, para logo de seguida me deixar em detrimento de um qualquer outro passageiro que por ali deambule àquela hora vespertina, O seu título de transporte, por favor.


Puta de mania essa a de chorar em transportes. E no entanto, estes continuam a ser o melhor sítio do mundo para chorar as cartas de amor que nunca hei-de expedir, que sem destinatário hão-de ficar, pois de mim e de ti não mais se escreverão mais palavras que justifiquem tantas e tantas cartas de amor por entregar. Delas me desfaço em lágrimas que povoam os bancos do vinte&oito, do sessenta, da linha verde e da azul.  

1 comentário:

  1. no Verão, e em todos os dias luminosos, escondo as lágrimas nos óculos escuros...

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